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Malo Mori Quam Foedari (Antes a Morte que a Desonra)

Hijacker


Hijacker estava junto da sua tenda com Tocha a trocar conversas e ao mesmo tempo a jogar a jogos de azar com alguns soldados.

O tempo parecia não passar e esta era muitas das vezes a melhor maneira de passar o tempo. Pondo a mão no ombro de Tocha Hijacker levanta se e vai ter com um dos criados da familia, crido este que tratava e tinha os Arminhos de Hij e Ana.

Como andam os nossos animais bom homem? Inquiriu Hijacker olhando para a gaiola que entretanto tinham arranjado para para guardar os animais.

Pegando na gaiola o criado passa a Hijacker.
Aqui tem Sr mas por favor não me peça para lhes toca, alimentar, o que quer que seja, esses pequenos diabos só sabem e morder.

Hijacker riu se e abriu a gaiola deixando os dois pequenos Arminhos subirem lhe pelos braços. Ana e Hijacker estavam tantas vezes em contacto com os animais que estes já estavam habituados e eram totalmente doceis para os dois.

Afagando lhe o dorso Hijacker ia passeando com os dois pela cidade. Este subiu a um sitio remoto nas muralhas, era o seu sitio favorito para pensar e passar tempo, era isolado e com uma vista sobre toda a cidade e horizonte.

Sentado com os arminhos a brincar entre as ameias das muralhas Hijacker vê a chegar uma caravana de pessoas que pareciam mesmo os seus familiar que tinham ficado para trás... Com um olhar mais atento consegue ver que era mesmo o Filipe que liderava o grupo.

A correr pegou nos arminhos e correu para a praça para avisar toda a familia.


Amigos Amigos, o grupo do Filipe finalmente está a chegar. Disse Hijacker com um sorriso muito rasgado. Onde está a Ana ela vai de certeza querer saber.

Toda a gente olhou em redor e ninguém sabia muito bem, até que um soldado disse a Tocha que ela tinha saido a cavalo com mais uns soldados em direção a norte noroeste pela manha.

Acabado de dizer aquelas palavras estava Filipe e todo o grupo a abraçarem a familia e claro a pergunta obvia estava feita.


- Alguém sabe onde está a Ana?

Filipe a Ana saiu de manha para dar uma volta desanuviar deste clima em que a cidade se encontra mas ela não deve tardar em voltar, anda vamos arrumar as vossas coisas. Disse Hijacker

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Filipesilva


Foi com um sentimento de decepção que Filipe ouviu a resposta de Hijacker. O seu primeiro pensamento foi de largar as suas coisas e partir de imediato à procura da sua amada, mas o conde não tardou a aperceber-se da oportunidade única que esta situação representava. Com o ânimo renovado, Filipe levanta a cabeça bem alto e responde ao Hij:

- Não há problema caro amigo, nós esperamos por ela. Onde é que nos podemos instalar? Lamento a pressa mas o sol já se começa a pôr e eu ainda queria visitar o mercado da cidade.

O grupo dirigiu-se então para uma pequena albergaria situada num local afastado das confusões, sendo necessário percorrer vários becos para lá chegar. Apesar de ser um edifício pequeno e de apenas ter um pequeno quarto disponível, o local tinha um ar muito agradável. Depois de descarregarem todos os seus haveres naquele pequeno quarto, Filipe nota que a sua filha o observava com um ar de desconfiada e o conde sabia do que se tratava.

- Não te preocupes filhota, eu não me esqueci de ti - disse Filipe enquanto sorria. Vamos lá ao mercado procurar uma prenda para a tua mãe antes que ela volte?

A resposta de Joanokax não tardou:

- Eu sabia que estavas a tramar alguma. Vamos claro!

Os dois apressaram-se então a ir para o mercado e quando lá chegaram transformaram o mercado num pandemónio, enquanto reviravam todas as mesas à procura de algo interessante. Por fim encontraram algo do seu agrado, e não poderia ter surgido em melhor altura já que os mercadores não estavam a gostar da brincadeira. Filipe e Joanokax dirigiram-se então de volta para o albergue quando se aperceberam de alguma actividade ao longe, junto às muralhas: as grandes portas da muralha estavam-se a abrir. Filipe teve um pressentimento que era a Ana que tinha acabado de chegar e apressaram o passo naquela direcção. Finalmente a família voltaria a reunir-se após aquela experiência de guerra.

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Ana.cat
O sol já começava a pôr-se no horizonte quando aqueles cavaleiros avistaram uma das portas de La Trémouille. Ana Catarina seguia mais uma vez na cabeça do grupo, atrás de si um dos cavaleiros carregava um estandarte com as armas dos Monforte, aquele leão de prata esvoaçante já era bem conhecido dos sentinelas da cidadela e por isso a passagem dos cavaleiros foi permitida sem muitas delongas.

Ao passar sobre a arcada em pedra daquelas portas a Monforte sentiu uma sensação estranha, um arrepio frio na espinha, como se alguma surpresa a esperasse dentro do burgo. E estava certa. Foram escassas as passadas que a sua égua deu dentro da cidade, vindo não soube bem de onde, Ana não quis acreditar quando diante dos seus olhos as figuras do seu marido e da filha se materializaram. Os impulsos foram mais fortes que a razão, de um só salto a condessa desmontou e correu desesperada na direcção de Filipe. Aquela corrida pareceu durar uma eternidade, as pernas tremeram-lhe e o coração saltava-lhe pela boca. Ana Catarina corria como nunca antes correra, a distância não era grande, mas o medo de aquela imagem ser uma ilusão ou fruto da sua cabeça motivaram-na a chegar o mais depressa possível aos braços do marido.
Quando esse momento se deu tudo em redor de Ana apagou-se, só Filipe tinha importância, ainda possuída pelos seus impulsos primários a Monforte abraçou o esposo e procurou os seus lábios... estes uniram-se como se fossem um. Ignorando as restritas convenções sociais e os olhares reprovadores de que o casal estava a ser alvo pelos que os rodeavam, Ana e Filipe só se separaram finalmente para Johanna se juntar a eles, num verdadeiro reencontro familiar. Finalmente estavam todos juntos e ali mesmo Ana suspirou perante os dois:


- Nunca mais nos havemos de separar, venha que guerra vier...
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--Gwereg
[Entretanto, em Gwened (Vannes)]


Finalmente tinham chegado a Vannes, no entanto a noite já estava a cair e com isso as ruas começavam a esvaziar-se de actividade e negócio, dando aos poucos lugar à agitação nas tascas e casas de má fama. Gwereg não se sentia seguro naquelas ruas estreitas e escuras, até Broceliande em noites de lua nova lhe parecia menos sinistra.
A sua relação com Bernardo já estava melhor, já se falavam e inclusive tentavam ensinar um ao outro palavras da sua língua, não tanto por curiosidade mas para melhorar a comunicação entre si.

Gwereg decidiu então entrar numa tasca para que alguém o pudesse ajudar a localizar a estalagem onde estava hospedada a familiar de Bernardo. Era um sitio sujo e repleto de marinheiros embriagados, alguns jogavam cartas, outros dançavam e cantavam músicas tradicionais, ao balcão um outro bebia a sua caneca de chouchen em silêncio, foi a esse que Gwereg se dirigiu.


- Ho sikour a c'hellan ober? Kerzh da glask ar ostaleri "Ty-War Or Atav".
[Você pode-nos ajudar? Procuramos a estalagem "Ty-War Or Atav".]

O marinheiro estava (ligeiramente) sóbrio e aceitou ajudar aqueles estranhos, pegando numa faca desenhou a localização daquela tasca no balcão e as indicações para chegar à estalagem pretendida.

- Trugarez vras martolod - agradeceu Bernardo vindo de trás de Gwereg
[Muito obrigado marinheiro]

O marinheiro lançou um olhar inquisidor a Bernardo e voltou a sua atenção de novo para o seu chouchen. Os dois viajantes apressaram-se a sair daquele ambiente intoxicado pelo cheiro álcool, mas não sem antes o marinheiro lhes dizer umas palavras finais.

- Kat leuskel mont tre hala...
[Não vos deixam entrar assim...]
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Joanokax


As últimas milhas no caminho foram as que custaram mais. Saber que estava tão perto... tão perto do reencontro.
Quando a altura chegou, a sua garganta secou e não conseguiu dizer nada, apenas chorou, chorou e sorriu ao abraçar a mãe sã e salva. Não se conseguindo afastar da sua mãe sentiu o seu pai, Filipesilva a abraça-las as duas, usando todas as suas forças para tentar parar as lágrimas que já rolavam pela sua face.

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Ana.cat
Ter os dois de volta era o mais importante para Ana. Finalmente a sua alma estava apaziguada e a sua atenção poderia recair para os assuntos da guerra.
Deu um beijo na testa da filha e pegou na mão do marido para os levar de volta à hospedagem onde estavam há dias alojados os Monforte. Pelo caminho matou saudades dos restantes familiares que acompanharam o grupo de Filipe, no entanto notou a falta de Bluemouse, lembrava-se que fora o ferido com mais gravidade no cerco de Poitiers e naturalmente estava preocupada com a sua recuperação. Ao questionar Johanna sobre o seu estado a jovem não quis adiantar muito mas Ana notou uma sombra perturbadora no seu olhar. A filha tinha grande estima por Bluemouse, parecia quase uma amizade colorida que Ana nunca entendera muito bem, mas verdade seja dita, a condessa nunca dera a grande importância e atenção aos relacionamentos de Johanna, excepto claro àqueles que ela considerava impróprios para o seu estatuto.


- Vamos descansar, está a fazer-se noite e amanhã irão continuar os preparativos para a marcha até Limoges - a Monforte silenciou-se por instantes e suspirou - Não estou tão confiante para a batalha que se aproxima, Limoges está bem defendida, afinal é a capital de Limosin et de La Marche, mas não só, também lá que a Rainha Nebisa costuma passar algumas temporadas quando não está em Île-de-France. Tomar aquela cidade marcaria o desfecho desta guerra - concluiu com um ar pouco confiante.

Ana conhecia a realidade que o exército esperava no caminho de Limoges, apesar de ser necessário manter a moral dos soldados em alta - aí entrava a fanática, mas eficaz, propaganda bretã anti-Nebisa - sabia perfeitamente que no outro lado iria encontrar um exército bem organizado e confiante a jogar no seu campo... como se diria na gíria do soule.

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--Gwereg
[Nessa noite, em Gwened (Vannes)]


Já era noite cerrada e as ruas de Gwened eram agora frequentadas por marinheiros bêbados, mulheres de má vida entre outros indivíduos com aspecto no mínimo suspeito.
Gwereg e Bernardo seguiam o caminho indicado pelo marinheiro da taverna, não era uma fonte muito fiável, mas fora sem dúvida a melhor que encontraram tendo em conta as circunstâncias. Os dois circulavam junto às paredes do burgo de forma a tentarem passar despercebidos. A iluminação era escassa à noite, algumas lamparinas de azeite colocadas ao longo das ruas da cidade distribuíam a sua tímida luz pelas áreas envolventes, no entanto no bairro onde aqueles dois estavam elas eram escassas e só graças à luz da lua era possível colocar um pé à frente do outro com confiança.

Bernardo seguia logo atrás de Gwereg no entanto a luz era escassa e por vezes perdia-lhe momentaneamente o rasto, nesses momentos o português limitava-se a correr um pouco mais depressa e logo o encontrava, chegando às vezes a cair quase em cima do bretão, o que causava sempre algum embaraço a ambos.
A dada altura Bernardo perdeu mais uma vez o rasto a Gwereg e começou a correr mais depressa para o apanhar, no entanto um puxão inesperado encostou-o a um beco escuro. O português mal teve tempo para dizer o quer que seja, sentiu uma faca afiada encostada ao seu pescoço e uma voz rouca ecoou no escuro:


- Ar sac'hadig! Reiñ ar sac'hadig!
[A bolsa! Dá-me a bolsa!]

Sem entender o que ele queria dizer, mas percebendo claro que se tratava de um assalto, Bernardo sacou da sua bolsa e entregou as poucas moedas que tinha no seu interior ao vulto que o ameaçava.

- Ar lagadenn! - vociferou novamente o atacante apercebendo-se do anel que Backnang tinha num dedo da mão direita.
[O anel!]

Aquele anel tinha uma profunda história atrás de si, para além de nele estarem gravadas as armas da sua família, fora um presente da sua noiva. Jamais o entregaria, muito menos a um salteador. Bernardo fechou o punho direito com força para impedir que o agressor forçasse a entrega do anel e debateu-se.
O ladrão apercebendo-se da resistência daquele deu-lhe um soco no estômago e espetou-lhe a sua faca num sitio aleatório, fazendo com que Bernardo caísse no chão com um grito de dor, de seguida pontapeou-o violentamente ao ponto de o deixar inconsciente aos seus pés.

Gwereg que já se tinha apercebido do desaparecimento de Bernardo, voltara atrás e graças ao seu grito conseguiu localizar o beco e cair em cima do salteador, que pego de surpresa não teve sequer tempo de ripostar. O bretão conseguiu controlar os movimentos do seu adversário e com perícia sacou-lhe a faca. Sem arma e bastante maltratado o salteador fugiu do beco deixando Bernardo inconsciente e bastante ferido nas mãos de Gwereg. O bardo bretão tinha agora a difícil tarefa de o carregar sozinho e encontrar um sitio para passarem a noite, estava visto que andar na rua àquelas horas não era seguro para ninguém.

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Ana.cat
O sol ainda não tinha nascido na totalidade quando Ana Catarina saiu da estalagem onde estava alojada para receber instruções sobre as actividades das tropas para os dias seguintes.
Escolheu ir a pé, afinal de contas não valia a pena ir acordar o moço da estrebaria para que este lhe preparasse a sua égua se o castelo de La Trémouille, onde se reuniam os oficiais, era já ali ao pé.


- Demoraria mais tempo a acordar o rapaz e a esperar que ele aparelha-se a égua que se seguisse este caminho a pé - murmurou para si, em tom de auto-aprovação pela escolha feita.

Como em todos os dias Ana Catarina deixara de lado os vestidos ricos e ornamentadas e vestira roupas quentes e práticas. Desde o início daquela jornada que quase se auto-flagelava por ter trazido alguns vestidos bem opulentos, tinha a sensação que nunca os iria vestir naquelas circunstâncias e só ocupavam espaço na sua bagagem!


- Sempre ouvi dizer que a França é terra de gente rica e bem vestida, talvez inconscientemente tenha pensado que eles também combatiam em traje de gala! Hahaha... - gracejou para si própria.

Continuou a caminhar, desta vez em silêncio. Equacionava se não estaria a ficar doida, porque raio estava ela a falar sozinha ali?! Era algo que se manifestava desde pequena, a tentação para pensar alto... enquanto que uns lhe diziam que quem o fazia era doido Ana Catarina sempre tivera o apoio do seu avô Pedro Simão, considerava ele que aquilo lhe estimulava a imaginação e a criatividade, portanto, aquela petiz nos seus cinco ou seis anos lá continuou a falar para si e para quem mais que a fosse ouvir. Corria o ano de 1429, o seu pai já tinha falecido com o seu tio, assassinados durante uma viajem de regresso a casa, a sua mãe raramente a via, era uma mulher infeliz e poucas vezes vinha visitar os filhos. A educação daquela criança que um dia viria a herdar a direcção de uma das mais antigas Casas do Reino ficara a cargo de Pedro Simão II, seu avô e após a morte deste, anos mais tarde, ao seu tio reverendo Tocha.
Pelo caminho até ao castelo de La Tremouille a condessa recordou aqueles momentos da sua inocência enquanto criança, sentiu a habitual nostalgia ao relembrar-se do seu velho avô e de tudo o que este lhe ensinara... aquilo que era sem dúvida devia-o aos seus entes.


- Bonjour sa Grace... - cumprimentou-a um soldado do castelo que já a conhecia e por isso lhe permitira a entrada sem quaisqueres questões.

Ana Catarina acenou-lhe com a cabeça, agradecendo a gentileza de lhe ter aberto o portão, e dirigiu-se à sala de jantar do castelo transformada durante a guerra em sala de reuniões dos oficiais e generais. A Monforte tinha a certeza que não seria chamada a intervir na reunião, provavelmente iria fazer apenas corpo presente ou, se tanto, relatar os viveres do exército em que estava integrada.
Ainda estavam poucos reunidos, os restantes, nos quais se incluía Kotapula, chegariam a conta-gotas com o passar do tempo.

E assim foi... todos chegaram, poucos participaram e no final ficou decidido acelerar os preparativos para a grande marcha até Limoges.


- En trois jours nous devons prendre les chemins!* - exclamou um dos cavaleiros des Trente, Meerclaw de Montfort, e dos estrategas enviados pela Bretanha.
[*Em três dias temos que tomar os caminhos!]
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--Gwereg
[Em Gwened (Vannes)]


Já era de manhã. Pelo menos assim o confirmava um distante galo cujo cacarejo ecoava por toda aquela zona da cidade. Gwereg dormia encolhido na sua capa à soleira de uma igreja, quem o visse pensaria que se tratava de mais um mendigo. Mas na verdade aquilo era apenas o resultado da noite anterior...

    *** (horas antes) ***

Uma faca, foi tudo o que deixara para trás o bandido que assaltara Bernardo naquela noite. O português continuava estendido no chão e inconsciente. Gwereg ainda estava confuso com tudo o que acabara de suceder, segurava aquela faca totalmente alheado da realidade, estava impressionado acima de tudo.
O bardo aos poucos foi-se recompondo e só depois de embrulhar a faca num pano e deixa-la cair no interior da sua mala foi socorrer Bernardo.
O bretão ainda não estaria ciente da gravidade dos ferimentos daquele, mas à medida que o tentava acordar com pequenos tabefes no rosto percebeu que não se travava de um simples desmaio. Bernardo tinha uma ferida no abdómen e tudo indicava que também tivesse várias costelas partidas para além dos golpes faciais que lhe tornaram o rosto quase irreconhecível e repleto de sangue.

A aflição começou a tomar conta de Gwereg, o que iria fazer agora? Se estivesse em Broceliande teria levado Bernardo para o seu refúgio, como da primeira vez que o viu, e dado-lhe a tomar alguns preparados naturais, mas estavam em Gwened, a maior cidade da Bretanha. Ali de certeza que não iria conseguir tratar Bernardo por isso o bretão teve que pensar numa alternativa. Voltar para trás estava fora de questão, o português não aguentaria a viagem, ir até à estalagem onde estava hospedada a familiar de Bernardo também não parecia a escolha mais sensata, jamais os deixariam entrar naquele estado e sobretudo àquelas horas. Então uma estranha ideia ocorreu a Gwereg. O bretão não era religioso, acreditava no que via e o que via era a natureza em todas as suas formas e manifestações. Por isso não deixa de ser estranho o local escolhido por Gwereg para tratar Bernardo, uma igreja.
Não fora no entanto uma escolha inocente, o bretão sabia que poderia ser numa igreja que encontraria ajuda e um tecto para dormir, ou pelo menos poderia sempre apelar à caridade e amizade tão apregoada pelos aristotélicos.

A igreja mais próxima era a escassos metros dali por isso não foi necessário nenhum esforço sobrenatural para arrastar Bernardo pelos braços. As portas do templo no entanto estavam trancadas e fora necessária bastante insistência (= fazer barulho, diga-se) para que um frade gordo e com ar arrastado viesse às portas ver o que se passava. Também não foi fácil a Gwereg convence-lo a hospedar e ajudar Bernardo naquela noite, muito menos quando o religioso se apercebeu que o bardo era um pagão. No entanto a retórica e os apelos sentidos do bretão convenceram o outro e este aceitou tratar das feridas de Bernardo, mas Gwereg não deveria sequer colocar um pé em solo sagrado - o interior da Igreja.
Apesar de alguma resistência por parte do bretão a esta imposição o frade foi inflexível e Gwereg passou a noite à soleira da igreja, enquanto Bernardo - esperava ele - era tratado pelo religioso.

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Ana.cat
[La Trémouille]


A reunião já tinha terminado. Ana Catarina voltara ao local onde os seus familiares estavam hospedados para lhes anunciar a data da partida, rumo a Limoges. Todos eles estavam cansados de esperar, pelo menos aqueles que há dias a fio permaneciam parados em La Trémouille. A aspiração de voltar para o campo de batalha e de fazer história naquela guerra permanecia no imaginário de todos e por isso a notícia foi muito bem recebida.
Nessa tarde a Monforte decidiu ir verificar o cumprimento das ordens dadas acerca dos preparativos da partida. Foi com agrado que constatou que as carroças já estavam preparadas para se fazerem à estrada e que tanto o material de combate como a comida já tinham sido repostos pelo Conselho do Poitou. Ana aproximou-se da parede onde estavam arrumadas as espadas e pegou numa. Girou-a na sua mão e sentiu a leveza do aço cujo peso igualava o do punho.


- Temos aqui trabalho de verdadeiros profissionais - elogiou impressionada com o arsenal que tinha diante de si - Estas armas se conjugadas com bons soldados com certeza levar-nos-ão à vitória - disse para o responsável do armazém.

Antes de voltar aos seus afazeres a condessa dirigiu-se uma última vez ao homem.

- Quero que mantenha este armazém, e o da comida também, permanentemente vigiados. Não podemos consentir pequenos furtos ou trocas fraudulentas. Se vir alguém em flagrante - olhou em redor, como que a verificar se mais alguém a ouvia - Tem o meu consentimento para fazer justiça pelas próprias mãos... - acrescentou num murmúrio.
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--Gwereg
[Em Gwened (Vannes)]


As horas sucediam-se e Gwereg continuava sem saber notícias do estado de Bernardo. Aquela situação começava a impacienta-lo, o bretão queria voltar o quanto antes para Broceliande, mas o compromisso assumido com o português não estava concluído. Gwereg sentia-se moralmente obrigado a permanecer ali, à entrada da igreja, até que um frade lhe desse notícias.
E isso demorou a acontecer. Os frades que frequentavam aquela igreja, próxima do seu mosteiro, local para onde levaram Bernardo, desvalorizaram a presença daquele pagão e só foram ter ao seu encontro quando tomaram consciência de que ele não iria arredar pé da frente do templo.

O frade que se dirigiu a Gwereg parecia franciscano, os franciscanos de facto estavam bastante disseminados pela Bretanha, era pequeno de estatura mas o seu excessivo peso compensava (ou não...) essa diminuta estatura. Gwereg quando o viu ergueu-se de imediato e foi ao encontro do clérigo, que apercebendo-se da velocidade com que aquele pagão se dirigiu a si deu dois passos à retaguarda, provavelmente assustado e com medo que aquele lhe lançasse um feitiço qualquer.
Gwereg por sua vez percebeu a reacção do frade e tentou-o sossegar. Ele só queria notícias de Bernardo para poder cumprir o seu compromisso.
O frade balofo tomou então coragem, embora mantivesse uma considerável distância de segurança em relação ao outro bretão, e contou-lhe sobre o grave estado em que o português se encontrava. Tinha várias lesões internas graves e a ferida provocada pela lâmina da faca também era preocupante. Apesar disto, Bernardo estava vivo e tinha raros momentos de consciência.
Gwereg ficou bem mais aliviado, e pediu permissão para o ver, talvez os seus conhecimentos adquiridos no ambiente quase selvagem de Broceliande pudessem ser usados para ajudar Bernardo. O bretão no entanto já previa que a sua proposta dificilmente seria aceite, e estava certo. O frade foi perentório. Não o queria sequer vê-lo mais à porta da igreja.

Gwereg rendeu-se à vontade do frade e após agradecer as suas valiosas informações, retirou-se do local. Andou à deriva pelas ruas de Vannes por largos minutos. As ruas já estavam de novo cheias de actividade e negócio. Os mercados fervilhavam com raros produtos de distantes regiões da Europa e não só. O bretão entrou naquelas ruas do mercado sem intenção de comprar o quer que fosse, queria apenas distrair-se.


- Win ar Anjev!* - gritou o vendedor de uma banca próxima de si.
[Vinho de Anjou!]

O bretão pretendia continuar o seu caminho mas algo o deteve junto daquela banca de vinho de Anjou. A voz de uma dama. Não era a voz em si que o detivera, mas a língua em que aquela falava. Não era bretão nem francês, era a língua de Bernardo, Gwereg tinha quase a certeza disso!
O jovem ficou imóvel a poucos passos da dama, discretamente olhou-a do canto do olho, era loira e vestia roupas trabalhadas pouco comuns naquela região. O instinto dizia-lhe que se tratava da familiar de Bernardo ou alguém próximo dele, mas faltava-lhe a coragem, não só a coragem mas também as palavras para se dirigir a ela. O pouco que Bernardo lhe ensinara não era minimamente suficiente para manter uma conversação.
Tinha que ser agora, pensou Gwereg, a dama acabara de adquirir alguns toneis de vinho de Anjou, estes estavam já a ser carregados para a sua carroça, e preparava-se para abandonar o mercado. O bretão encheu o peito de ar e dirigiu-se a ela, tocando-lhe levemente no braço. Quando esta o encarou parecia assustada com a sua figura. Gwereg apressou-se a tentar sossega-la.


- Ahm... kalmah... êh serr... ahm... - ficou sem saber o que dizer, por isso apressou-se a completar em francês, talvez assim ela o entendesse melhor - Ami de Bernardo! J'ai besoin de parler avec vous sur lui!*
[(...) amigo de Bernardo! Preciso de falar consigo sobre ele!]

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Ellinha


Toda atrapalhada, com os cabelos em desalinho, as faces rosadas e com muita pressa devido a estar no mercado há mais de uma hora, primeiro tentando se comunicar com o belo mercador francês que a tinha impressionado por demais. Belos e penetrantes olhos azuis, cabelos negros que contrastavam com sua pele alva, seu sorriso perfeito, seus modos nobres e atenciosos, deixaram Ellinha sem jeito. Acostumada com os modos rudes e grosseiros dos portugueses aquele francês era um balsamo, tanto para seus olhos, como para minimizar a solidão que se apossava de sua alma. Tudo bem que tinha que a toda hora procurar as palavras em uns pedaços de pergaminho que Hijacker tinha lhe dado com traduções para que pudesse ao menos comprar comidas e bebidas no mercado local de Vannes. Não entendia uma palavra do que diziam, mas devido às anotações, conseguia ao menos ir às tavernas, pedir comida, bebidas e uma cama para dormir.
As negociações tinham sido feitas, os tonéis estavam colocados na carroça que a levaria de volta a estalagem. Despediu-se do mercador que fez uma vênia a Ellinha, pegando-lhe a mão a levou até os lábios, desejando-lhe um ótimo final de dia e convidando-a para jantar.

Quando já estava subindo na carroça, sente que alguém lhe agarra o braço e, assustada, vira-se, deparando com um homem que lhe dirigia a palavra:

Quote:
- Ahm... kalmah... êh serr... ahm... - ficou sem saber o que dizer, por isso apressou-se a completar em francês, talvez assim ela o entendesse melhor - Ami de Bernardo! J'ai besoin de parler avec vous sur lui!*
[(...) amigo de Bernardo! Preciso de falar consigo sobre ele!]


Elli atrapalha-se toda, ainda assustada, procura nos pergaminhos as palavras... tanta dificuldade... � O homem fala arrastado e muito depressa...- pensa Elli. Olha para os lados, ninguém... � Ai, meu Jah... � pensa Elli. Com o melhor dos sorrisos e procurando as palavras certas nas anotações diz: - Pouvez-vous parler plus lentement, Monsieur?

Ouve-o repetir lenta e pausadamente: - Ami de Bernardo! J'ai besoin de parler avec vous sur lui!* ... Hmm amigo de Bernardo...O que tem o primo Bernardo? aconteceu-lhe alguma coisa?� pensa .... depois diz ao homem - Plaisir, Monsieur, mon nom est Ellinha de Monforte. Que puis-je vous aider?
[Prazer, Senhor, meu nome é Ellinha de Monforte. Em que posso ser-lhe útil?]





--Gwereg
Gwereg ficou mais tranquilizado quando percebeu que a senhora loura não reagira de forma negativa ao seu atrevimento e mais ainda quando sentiu que esta o compreendia, apesar de recorrer a umas pequenas cábulas e à aia que a acompanhava.
O bretão então dirigiu-se à jovem aia e que parecia compreender o francês.


- Dire à votre Madame que son cousin Bernardo a perdu sa famille restante. Je l'ai conduit à vous, mais hier il a été attaqué par un voleur, est maintenant sous la garde des moines de Sant Patern.*
[Dizei à sua Senhora que o seu primo Bernardo perdeu-se dos seus restantes familiares. Guiei-o até vós, mas ontem foi atacado por um assaltante, está agora aos cuidados dos monges de Sant Patern.]

A aia pareceu compreender a mensagem e transmitiu-a à sua senhora, que como Gwereg previa tomou um semblante carregado e confuso. Na sua língua nativa ela fez mais perguntas à aia para que ela as fizesse em francês ao bretão. E assim se comunicaram e fizeram compreender por alguns minutos.

    * * *

Dias passaram... Gwereg ficara em Gwened a pedido da familiar de Bernardo, estava agora alojado numa velha estalagem paga por ela. Quanto a Bernardo, permanecia inanimado no seu leito no mosteiro dos monges franciscanos de Sant Patern, o padroeiro da cidade. Gwereg ia visit-lo sempre que os monges lhe permitiam, mas o bretão torcia o nariz à forma como aqueles religiosos encaravam as suas maleitas, em vez de lhe fazerem engolir os remédios que a natureza lhes propiciava recorriam ao estranho - para Gwereg - método do sangramento. A olhos vistos Bernardo definhava, a sua juventude anteriormente estampada no rosto esfumava-se e a sua pele anteriormente bronzeada estava mais pálida que a de um cadáver. Nada de bom aguourava a seu favor.
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Ana.cat
Nota: Os intervenientes deste RP já se encontram em Portugal, mas como não faz sentido deixar isto a meio decidiu-se continuar.



[Estrada entre La Trémouille e Limoges]


A saída de La Trémouille tinha-se dado nessa manhã. Pela frente os exércitos do Ponant tinham uma longa caminhada até Limoges, a capital de Limosin et La Marche. Ana Catarina, como já era habitual, seguia a cavalo na frente do seu contingente.
O tempo estava gélido e a neve acumulara-se nos caminhos fazendo com que a progressão da coluna militar se arrastasse a passo lento. E na ausência de movimento os soldados enregelavam sob a neve que começara a cair.
Ana Catarina nunca experimentara semelhante situação, apesar da grossa capa que enrolara à volta do corpo o frio parecia penetrar-la até aos ossos, as suas mãos gélidas começaram a ganhar uma tonalidade roxa e os dedos perderam qualquer sensibilidade e nem mesmo as luvas de couro pareciam impedir isso, finalmente começava a fazer sentido na sua cabeça o porquê de antigamente os Reis franceses evitarem guerrear no inverno...
No alto da sua montada a condessa ocasionalmente parava para olhar a sua rectaguarda. Atrás de si os soldados caminhavam a pé, com neve aos ombros, as faces roxas e quase inchadas por causa do frio, aqueles pobres homens faziam os possíveis e impossíveis para caminhar sobre a neve com a ajuda dos cabos das lanças. No entanto eram os soldados do fim da coluna que mais perigo pareciam sofrer, a neve que pisavam já estava de tal modo prensada de tanto pé que por ela passou que ficara escorregadia, não eram raros os tombos e acidentes entre os soldados, à medida que se avançava no caminho mais se fazia ouvir o choque de metal sobre metal.


    * * *

Foram necessários três dias de viagem para chegar às imediações de Limoges, onde os exércitos do Ponant montaram acampamento. Os arredores da cidade eram visíveis a olho nu, no entanto a neve continuava a cair impossibilitando qualquer ataque surpresa ou início de cerco à capital de Limosin et La Marche. A moral dos soldados não era a melhor, o frio extremo provocara muitas baixas entre as hostes. No entanto uma notícia espalhou-se rapidamente, provocando o entusiasmo geral entre os soldados.

- Tomaram Tours! - gritavam pelo acampamento - Tomaram Tours! Touraine caiu às mãos dos berrichons! - acrescentavam entre risos

De facto era no mínimo irónico que a capital do Ducado que despoletara a guerra, ao invadir o Ducado vizinho do Berry, caísse agora às mãos de cavaleiros do próprio Berry...
Aquela noite foi uma excepção às anteriores, se antes reinava a exaustão e desilusão agora celebrava-se a queda de Tours como se a própria guerra tivesse terminado ali, o vinho jorrou sem que os oficiais pudessem impedir, dançou-se e cantou-se até tarde.
Ana Catarina ficou na sua tenda, tamanha histeria não era bem vista por ela, principalmente quando a qualquer momento as condições do tempo podiam melhorar e possibilitar-lhes uma janela de oportunidade para atacarem o inimigo... ou serem eles atacados...

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Eudoxio


Eudóxio tentava descansar. Estava cansado, tinha frio e todo o ambiente festivo por que passava o acampamento impossibilitava-o de dormir. Deitado, sentia as pernas doridas e os pés, que não tinham chegado a curar-se completamente desde que Eudóxio decidira punir-se com longas e incessantes caminhadas, ardiam.

Não conseguindo descansar, rapidamente se viu atormentado com os mesmos pensamentos e as mesmas questões de sempre. Cada vez estava mais próximo da sua primeira batalha e estava receoso. Decidido a não se desgastar a pensar em demasia, levantou-se e começou a dirigir-se para fora da tenda. Não chegou, porém, a conseguir sair, pois nesse momento Erwana entrou pela tenda adentro, com um sorriso no rosto e uma caneca de vinho na mão. Aquela não era certamente a sua primeira caneca da noite.

Então, monsieur? É tempo de festejar! Prove este vinho... é dos melhores das redondezas!

Eudóxio esforçava-se por não beber desde que se vira acordar no meio de uma taverna, cheio de dores de cabeça, e havia ficado para trás, pelo que recusou.

Não sabe que um cavalheiro deve sempre acompanhar uma senhora numa bebida? - rematou Erwana, sorrindo, insistindo até que Eudóxio finalmente deu um gole de vinho.Além demais ninguém nos chateará. Esta tenda é só nossa.

Lá isso é verdade.-concordou o Monforte. Tinha tido direito a uma tenda que decidira partilhar com a bela bretã. Claro que passara a ser invejado e odiado por vários soldados (não por causa da tenda, claro está), mas valia a pena.

Com Erwana nos braços rapidamente se esqueceu de todas as dores que sentia e de tudo que o atormentava. E conseguiu ter o descanso de que tanto necessitava.

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