Vede pois, como são as cousas: viajor com natureza sábia sempre extrai o melhor do que cada detalho da estrada lhe revela; não importam intempéries ou mau humor do tempo, nem mesmo a vilania (dalgum fora da lei algures) que possa lhe acometer: é senhor do próprio coração o caminhante, a não esmorecer tão facilmente, e desfrutar do que for possível.
Aristarco nada conseguira extrair naquela prosa, enquanto o bom amigo não chegava daquela inspeção e averiguação do bom lago que não estava mui distante dali: o trovador se espantava com o ímpeto do amigo, porque ele próprio já havia desistido de sair da taberna, quando seu corpo já ficara cansado, diante um esforço dum trecho entre o caminho de Alcobaça e Leiria.
Quando então finalmente Eudoxio chegou, puseram a se conversar todos sobre aqueles insucessos da investigação, mas como pode ser algo assim, oras.
Mas convinha não esmorecer facilmente, como cabe a viajor ou soldado, ou ambos num só tempo repentinamente.
E Aristarco se ria a valer quando ao lado do bom amigo Eudoxio, faziam verdadeira peleja e embate com cavalaria para saber daquel segredo assim que puseram os pés (ou patas de cavalo e boi, por melhor dizer) na boa Leiria, do famoso lago com sua magia ou encanto.
A senhora Vst fora deveras habilidosa em ocultar as cousas referentes àquele afamado lago (parece que tem cousas que não devem ser faladas, mas descobertas por si mesmo), mas não se pode desistir assim dum bom duelo (de palavras) e aqueles viajantes do sul lusitano, nada de arredarem o pé ao perscrutar o mistério que envolvia a bela vila.
Até quando o Monforte se aprumou e na boa tática bélica, talvez a rememorar uma velha história vivida na Bretanha (que aqui levaria a um inusitado capítulo de bom longo livro), fez prosa delineada e floreada para que a preclara dama se convencesse a ceder receitas daquela bebida também mágica da taberna, porquanto parece que há questões que jamais se podem supor facilmente, como a relação distinta e espantosa da magia do lago com a magia de beberagem... Eis aí mais mistério.
Quem pode explicar isso, não se sabe; ou melhor, se sabe mui bem, eis a senhora Vst, mas que nem por qualquer magia (até a de Leiria, imaginai!), há de revelar o que move e instiga tais segredos da vila.
Paciência, paciência, mesmo bom cavaleiro sabe momento de que não se vence a lida, fica-se para outro dia e em melhores condições (mas sem desistir do fito): hoje vence a dama que convence Eudoxio e Aristarco viajantes, a desfrutarem da boa bebida e não mais insistirem em peleja já derrotada.
E enquanto riam-se, porque se há magia que se possa entender ainda é aquela que no convívio a taberna há de gentilmente conceder, tomavam mais um bom trago da bebida, e Aristarco parou por um instante para assim cantar em boa voz, cantiga daquel evento:
REDONDILHA
Mote
Cavaleiro luta bem, mas bebe magia,
Se contagia, pois partida vem logo também.
Voltas
Em Leiria ao chegar
Seja condição qualquer:
Liberto ou degredo
Bem no que s achar,
Pois não há que se deixar
Daquilo que tão requer
Leiria: seu segredo.
Se diz aqui: El lago
Ou acolá: bebida.
Tudo vem com agrado:
Qual natureza? Divago,
Pois é tema dum mago.
Mas luta é sabida:
Dama ganha el brado.
Descansa assim então,
Quando alma é feliz
Bondade bem propago:
Amizade faz clarão
Mais magia na questão.
Eis Leiria que assi diz:
Desfruta mais um trago.
Há mui cousas mágicas ou misteriosas neste velho mundo, e pouco se saberia dizer um viajante destes dotes do lago ou da beberagem na boa taberna de Leiria.
Porém, talvez uma das mais inquietantes, seja a que leva à Amizade benfazeja, deveras misteriosa: se Leiria manteria seu segredo bem guardado a atiçar mil curiosidades, causava aos viajores não menos, a certeza (por vezes misteriosa) da boa fraternidade lusitana.
Que boa paragem, boa paragem sim, de Leiria.
E há que disto tudo, desfrutar.
Com mais um trago...