Madalena conhecia aqueles sentimentos de cor e apenas assentiu com a cabeça, balbuciando palavras vagas:
Compreendo... claro Antonieta, ainda hoje me acontece... No momento seguinte, perdeu-se em acontecimentos passados. A sua primeira noite de trabalho fora custosa, em boa verdade fora um tormento. A meretriz pouco mais era do que uma menina e, apesar de ter crescido na Babilónia, entre homens meios despidos e mulheres libidinosas, naquela tenra idade conservava ainda alguma inocência. Aquela parca pureza foi-lhe roubada cedo demais, profanaram-lhe o corpo, despiram-lhe a alma, utilizaram-na sem propósito passível de compreensão. A pequena Madalena chorara dias a fio, encolhida a um canto do quarto, não comera, não bebera, muito menos falara. Ao fim de quatro dias de luto, Júlia interviu. A monstruosa proxeneta não lhe deu outra opção a não ser submeter-se, falou-lhe carinhosamente, cantou-lhe em voz baixa naquela noite, mas deixou bem claro que se não atendesse os pedidos dos senhores, acabaria na rua. Ainda assim, Madalena acreditou que podia ser feliz.
Agora, quase dez anos depois, fora Madalena que submetera Antonieta ao tormento. O engraçado era não sentir remorsos, talvez um pouco de pena, talvez compaixão, se procurasse bem no fundo, mas nada mais do que isso. Estaria a ficar vazia? Não, não podia ser. A meretriz ainda era capaz de sentir. Tinha de acreditar que sim, ainda era capaz de preocupar-se e julgava sentir afeição por algumas pessoas. Nem tudo estava perdido.
Antonieta terminara o pequeno lanche que lhe servira e Madalena perguntou-lhe:
Não tens sono? Precisas de descansar._________________