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[RP] O discípulo

Adriano


-Bons olhos o veem, mestre. Que tenho eu de fazer hoje?

O velho mestre pareceu sorrir, ou teria sido apenas uma sombra passageira a enganar os olhos do jovem discípulo, pois nada bom parecia vir ao resto do dia quando o velho mestre sorria antes de lhe dar uma tarefa.

- Hoje menino, forjarás um punhal. - disse com um tom de pouca importância, mas antes que o jovem pudesse dizer qualquer coisa, o velho mestre retirou um objeto coberto por um tecido aveludado de suas vestes. - E o farás com isto. concluiu entregando o objeto ao jovem.

Se ele conseguir dominar este aço ainda haverá esperança. pensou Adriano enquanto lhe entregava a peça.

Debaixo do tecido estava uma unica barra de aço de menos de meio quilo de peso, sobre sua superfície lisa duas marcas estavam estampadas, uma era a Cruz de Azure, a outra era desconhecida para a maioria dos que hoje eram vivos, e seus significados eram conhecidos por menos ainda, pois encerrava os antigos conhecimentos dos quais Adriano era detentor. Uma marca que John já havia visto antes, em um livro, que lhe havia sido entregue por outro velho mestre...aquele não era um metal qualquer...
Johnrafael


Tateou a peça de aço. Era muito pesada e muito brilhante. Uma das efígies era a cruz de azure, a outra... Entrou correndo na forja, não podia acreditar. Era aço da irmandade, Feito de ferro celeste*. Aquele seria o teste definitivo. Abriu o livro:

Citation:
FRATERNITATEM CHALYBS EST EX CAELIBVS.
SOLVM ELECTI SCIRE FORMULA PERFECTA
SOLVM DISCIPVLVS QVI PRAEDOMINAT IN CHALYBS CAELESTIA MAGISTRI TITULO HONORANTUR.
NISI QUI VINCIT CHALYBS CAELESTIA ESSET ISTA FRATER


"O aço da irmandade vem do céu. Só os eleitos conhecem a fórmula perfeita." Leu novamente todas as recomendações do livro, as quais já quase tinha decorado. Acendeu a forja e depositou a barra dentro. Um arrepio percorreu-lhe. Por um segundo, pensou ter visto uma figura humana dentro do aço.


*Ferro meteórico. Mais informações aqui

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Johnrafael


Horas se passaram. O aço celestial era resistente como pedra. Fazer surgir a lâmina demorou quase o dia todo. Bater, temperar, bater, temperar... Quando acendeu as tochas a lâmina ganhava corte. Enquanto isso, o pequeno Brun saltava de lado a outro por baixo das mesas.

Minutos depois, com o pomo e a guarda encaixados, faltava apenas a bainha. Entalhou a madeira lentamente até ter o espaço perfeito de encaixar. Mas estava infernalmente escuro... E o arminho entre suas pernas... Apanhou o punhal mais uma vez para medir o entalhe, mas perdeu o equilíbrio e caiu sobre um dos tenazes. O grito de dor foi lancinante,e a marca em sua perna ardia.

Adriano, enquanto isso, nem se moveu. Aquilo pra ele já era comum.

Veste e pele queimadas, levantou-se e recomeçou.

Logo, apesar da dor, estava terminado o punhal, o mais longo que já fizera, pois em nenhum momento o aço se partira.

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Adriano
Quando o jovem ferreiro já estava dando por terminado o seu trabalho o velho se aproximou e lhe tomou a lamina das mãos. Percorreu seu fio com a ponta dos dedos, e a fez girar algumas vezes em sua palma, segurando-a em seguida pelo punho a lançou para cima observando o giro que a arma proferia no ar antes de agarrar-la pela lamina e lançar-la em direção a cabeça de John, evitando esta por poucos centímetros a lâmina enterrou-se na coluna de madeira atrás do jovem.

Sem dar ouvidos aos resmungos e reclamos do Viana Lobo, Adriano se aproximou de onde a lâmina havia impactado e a observou detidamente por alguns minutos. Ao final soltou um profuso e sonoro - Hmpf! e caminhou em direção à porta, dando as costas para ambos ferreiro e lamina, antes de sair para o ar fresco da noite apenas disse: Esta desequilibrada. Re-faça-a!
Johnrafael


M... Mas... Como? Eu levei um dia inteiro preparando essa lâmina! NÃO É POSSÍVEL! Vamos, OLHE NOVAMENTE! - Parou o velho, segurando em seu ombro e apontando-lhe o punhal. NÃO HÁ NADA DE DESEQUILIBRADO AQUI!

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Adriano


O velho Adriano girou sobre si mesmo e propinou um doloroso golpe de bastão na testa de John e bradou: - MENINO TOLO! ACHAS MESMO QUE ESSA LÂMINA ESTÁ EQUILIBRADA!! OU QUE ESSE METAL É COMO QUALQUER OUTRO!! - a surpresa era evidente no rosto do rapaz. - SEU MOLEQUE ESTÚPIDO! - continuou rugindo o velho mestre ao bater novamente no aprendiz com o bastão, dessa vez na mão que ainda segurava o punhal recém feito, que, com um tinir de metal contra pedra, caiu no piso da forja.
Johnrafael


Irritado com aquela situação, cuspiu no chão e bradou, numa altura semelhante à do velho mestre:

-POIS FAÇAS TU ESTE MALDITO PUNHAL! - Chutou a arma entre os pés do velho e saiu, fumegando de raiva, levando apenas o pequeno Brun, que assustado com os gritos, tentava se esconder num canto de parede.

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Adriano


Depois que o jovem Viana Lobo saiu da forja Adriano sorriu, levantou o punhal do piso e o desarmou retirando as travas que mantinham a lâmina unida a empunhadura, e acomodou as peças com cuidado sobre a mesa. Passou com cuidado a ponta dos dedos em toda a peça metálica tomando cuidado com o fio da lâmina.

O brilho argentino que tinha ao refletir o fulgor das brasas que ainda ardiam na forja era quase hipnótico.

Ele já tinha os olhos cansados e nos últimos dias por vezes sentia que a respiração lhe falhava, mas ainda tinha uma missão por cumprir antes do fim. Adriano fechou os olhos por um momento, e voltou a abrir-los para ver a sua frente uma visão do passado, seu antigo mestre o recordava que o tempo lhe estava acabando.

O mestre ferreiro voltou a olhar para a lâmina e suspirou falando para si ou para a visão, não saberia dizer - Já falta pouco meu jovem discípulo. - E para seus ouvidos sua voz soou como a de seu próprio mestre. - Ele já aprendeu a dominar os metais deste mundo e os golpes do martelo, já sabe controlar o calor da frágua e os tempos da têmpera do aço. Mas agora lhe falta a lição mais difícil de todas. - O velho ferreiro foi caminhando com passos curtos até o livro que John havia consultado quando recebeu a pequena barra de aço da irmandade, enquanto girava a lâmina entre os dedos. Abriu o livro na página que buscava, onde em uma caligrafia fina havia escrito:

Citation:
"Aquele que busca dominar o segredo do Aço da Irmandade deve saber controlar o fragor das duas forjas e equilibrar os quatro e os três no fio dos dois para que o Caminho seja verdadeiro seja ele qual for e que o aço branco seja seu aliado e não seu Senhor. Quando aprendas o significado destas palavras encontrarás o Valeriano."


Sobre aquela página deixou Adriano aquela lâmina desequilibrada e deixou a forja. Ele havia mostrado a porta, dependia do jovem entrar naquele Caminho e vencer, ou perecer na tentativa.


Johnrafael


Saíra para a Taberna, mas voltara pior à forja. Tivera uma briga com um qualquer nível um que se engraçara para uma de suas protegidas e acabou por ser retirado à força pelo pai e pelo irmão. Aquele temperamento bruto não lhe fazia nada bem.

Tornou à forja já era madrugada. Os tocos de vela que já não haviam sido apagados ardiam num resto mínimo de cera. Procurou o punhal e veio encontrá-lo numa página do Livro.

Tornou a lê-lo. Leu, leu e releu, até que a lógica simplesmente quis aparecer. Em sua mente, as informações corriam como um cão de caça em perseguição ao coelho. Quatro, três e dois. Mas não existe dois. O dois não é dois. O dois é um e um, e o equilíbrio dos dois é a chave. Porque Adriano equilibra o punhal no dedo e não se fura?

Apanhou o punhal e tentou equilibrá-lo no dedo. Só conseguiu mais um corte. Atirou-o então de volta à forja, e sentou-se diante do fogo, vendo a peça arder. Fogo crescia também no interior de si.

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Adriano


Varias semanas haviam se passado desde que estivera com John por última vez, e havia chegado o tempo de Adriano partir em uma viagem da qual talvez não regressasse, mas antes deixaria um pequeno presente para seu discípulo.

Caminhou com o passo demorado dos que já estão em uma idade avançada, apoiado em seu bastão com as costas curvadas pelos anos de trabalho na forja, e a vista cansada e nublada. O frio do inverno não facilitava as coisas para o velho mestre ferreiro. Uma mão firme o segurou em um momento de desequilíbrio quando seu bastão escorregou em uma pedra lisa.

- Deves ter cuidado Comendador. - disse a voz suave acompanhada pelo branco sorriso do jovem que o acompanhava.

- Já não sou o mesmo que antes meu amigo, e em breve me unirei aos antigos na graça dos Nove.- respondeu o velho roucamente.

- Assim será, mas não hoje. Não ainda. - foi a resposta do jovem que agora oferecia o braço para que Adriano se apoiasse.

- Obrigado jovem Gascón.

Assim, apoiado no jovem escudeiro da Ordem, Adriano cruzou a cidade até a forja de John, quem havia dias antes partido para Chaves. Tirou um envelope de dentro de sua capa e o deixou debaixo da porta trancada. Uma última lição antes de partir.

No envelope dois objetos repousavam, uma pequena nota na qual se podia ler a um lado "flamma viam veritatis signat" e ao outro "in umbra occulta". E junto a nota havia um pequeno disco com sete furos em forma de um relógio de areia, um furo para cada esquina e três no centro.
Johnrafael


[i]Na manhã após retornado de Chaves, reabriu a forja e notou que Adriano lhe deixara uma última lição. Tomou o papel e leu:

-A chama marca o caminho da verdade, na sombra oculta.

Matutou uns poucos instantes naquela frase. "O Mestre pôs em dois lados. É um teste."

-Oculta na sombra, a chama marca o caminho da verdade.

"Também pode ser, mas e esse disco?".

-Dois três e dois... O que é isso? - Exigia muito de sua cabeça. "Tudo está nesse livro, tudo pode ser lido..." ouvira uma vez. Passou as páginas do volume, vendo se não havia nada que lembrasse os furos no disco. Passou por todas as páginas que conseguia ler.

-Raios... mais que isto não há, está tudo na língua dos Mouros. - Soltou o livro sobre a mesa e voltou a analisar a peça. Uma brisa fria entrou pela forja, fazendo o jovem bater os maxilares e as páginas voarem. John levantou-se, fechou a porta, e quando voltava para guardar o livro, notou, nos trechos do livro em língua moura, uma imagem:



Era ali que estava a informação que necessitava. Aqueles eram os pontos que o disco mostrava.

-Mas que quer dizer isso? Que palavras são essas?

John sabia Português, Castelhano e um razoável Inglês, que aprendera com sua mãe e nas tavernas, mas a língua moura lhe era estranhíssima. Seu tio Yochanan sabia, mas estava em Chaves.

-Talvez um de seus irmãos de Azure saiba. Irei até lá.

Montou seu cavalo, que estava numa das estrebarias que mantinha a Casa do Povo, e partiu rumo ao Paço dos Arcanjos.

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Johnrafael


Horas mais tarde, ao Norte do Porto.

Jamais devia ter se rendido ao furor da descoberta. O Paço dos Arcanjos era distante meio dia de viagem. Um dia inteiro, passara no lombo do garrano, cavalgando o mais rápido que podia. Estava tão exausto e tão faminto quanto sua montaria, e o sol já começava a descer na Villa, sede da Ordem de Azure.

Parou em frente aos portões da fortificação, que logo foram abertos. Não era visita recorrente, mas já o conheciam ali. Um pajem levou o cavalo para ser alimentado e tratado, enquanto o jovem Viana seguiu para encontrar-se com o Mestre Dimas.

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--Dimas


Quando o Prior saía em suas viagens pelo reino, Dimas oficiava de castelão do Paço dos Arcanjos. Sua idade avançada já o impedia de fazer as longas viagens ao serviço da Ordem, mas seus conhecimentos eram melhor aproveitados ali mesmo no Paço onde os jovens eram treinados nos Nove Círculos da Ordem de acordo com as suas aptidões.

Dimas Arantes observava o treinamento de alguns dos jovens no combate com o bastão impartido por Gascón, um rapaz que havia ganho em seus poucos anos o apreço do velho Mestre Arcani.
Baixo a tutela de Dimas, o escudeiro internava-se nos primeiros passos do Círculo dos Iquimas ao qual se iniciaria quando fosse digno do grau de Cavaleiro da Ordem.

Foi ali que indicaram a John para ir quando ele chegou. E após os protocolares cumprimentos ao som dos golpes de madeira dos bastões, o velho Dimas disse finalmente:

- Pareces faminto meu jovem. Venha, lhe conseguiremos algo de comer e me contarás o que o trás aqui neste dia.

E então guiou o jovem Viana Lobo ao refeitório onde lhe foi servido um prato de caldo quente e uma caneca de cerveja aguada enquanto Dimas tomava o assento em frente do jovem.
Johnrafael


No refeitório do Paço, tomou o caldo com alguma rapidez e um pedaço de pão. Não comera nada o dia todo, era justificável. Refeição concluida, pegou o pequeno disco de metal num bolso, junto com o livro, e colocou-o aberto, virado para Dimas.

-Mestre Dimas, não conheço a língua nem a escrita dos mouros. Por conta disto, sou incapaz de ler o que me diz esta passagem. Mestre Adriano deixou-me isto, junto com uma mensagem que dizia: Oculta na sombra, a chama marca o caminho da verdade. Vós sois velho em anos, e rico em saberes. Poderia ajudar-me com estas palavras?

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--Dimas


O velho mestre apoiou a mão naquelas páginas abertas e sorriu para a figura que estava ali desenhada e as letras escritas na caligrafia de outro velho mestre que já era velho quando ele era jovem e visitava Bayt Ghyr Mawf, mas foi o disco feito do fino aço branco que chamou a atenção de Dimas que o tomou em suas mãos enquanto escutava as palavras de John.

- Um belo enigma lhe deixou seu mestre, meu jovem, um mistério decerto muito interessante. Mas não lhe darei a resposta, pois toda resposta começa com uma busca, e essa busca deve ser feita por cada um de nós se esperamos algum dia encontrar nossa própria verdade. - disse o velho mestre com a voz rouca da idade. O desanimo do jovem foi evidente aos olhos de Dimas, ao que completou após uma pausa. - Mas venha, caminhe comigo que lhe contarei uma história.

O mestre então se levantou com certa lentidão e se dirigiu ao exterior, onde o sol já se havia posto haviam algumas horas naqueles dias de inverno, e baixo a luz de tocha alguns grupos terminavam os treinos do dia que os fortaleceria para os combates no frio mordaz do inverno caso tal algum dia ocorresse. O exterior era tão aliado de um irmão da Ordem como o era o interior.

Uma brisa fresca soprava, mas naquela noite o céu estava límpido e as estrelas brilhavam como contas de brilhante no manto noturno. O disco ainda firme na mão do mestre era quase uma relíquia da qual restavam muito poucas, e menos ainda feitas naquele raro metal.

Por alguns momentos Dimas se deteve no caminho que ligava o refeitório ao caminho que subia até a Villa e ficou a olhar o céu meridional em busca de algo e quando o encontrou se deteve olhando naquela direção por alguns momentos, e então fechou os olhos e começou a dizer:

- John, preste muita atenção no que vou lhe contar, pois este disco que lhe deixou Adriano abre muitas portas, mais das que pode ser que estejas preparado para conhecer, mas ainda assim teu mestre acredita que estás pronto para iniciar teu caminhar por elas. - o mestre fez então uma pausa breve na qual respirou algumas vezes antes de continuar. - Em toda luz há uma sombra, e em toda sombra há uma luz, pois em uma sem a outra nada existe. Esta é uma das máximas de nossa Ordem, e ainda que a simples vista seu significado é claro e profundo, se nos aventuramos mais profundo nela encontramos ainda mais outras verdades e uma delas repousa no enigma que lhe propôs o teu mestre.

Para este momento o treinamento guiado por Gascón havia findado, e os jovens alunos cruzavam o caminho em suas vestes cinzentas. Durante este tempo o velho mestre ficou em silêncio observando os jovens que se dirigiam ao refeitório em silêncio.

Quando o último deles já estava a muitos passos de distância, Dimas retomou o relato.

- Houve certa vez há muitos anos e outras tantas léguas daqui, um jovem arqueiro que era já desde mui tenra idade hábil com o uso do arco. Suas flechas voavam certeiras e eram desconhecidas as vezes que o jovem falhara o alvo. De sua habilidade o jovem fez sua fama, e na corte do rei daquelas terras era ele considerado o melhor arqueiro do reino. Mas então certo dia enquanto viajava junto de alguns companheiros pelos campos daquelas terras encontrou o jovem arqueiro a um velho andarilho que viajava apoiado em um bastão que já parecia curvar-se de tão antigo que aparentava. Ali onde o ancião o segurava, a madeira já estava polida pelos anos do toque humano. - Dimas fez uma nova pausa e inspirou profundamente o frio ar noturno antes exalá-lo devagar e continuar a historia em sua voz grave. - Aquele encontro parecia fortuito, pois o jovem e hábil arqueiro havia estado caçando naquele dia e trazia consigo algumas perdizes que seus projéteis haviam perfurado com habilidade, e já cantavam os seus companheiros que jamais houve sequer algum arqueiro tão hábil como ele. O velho que mais parecia um mendicante faminto pediu ao jovem se lhe poderia dar algo de comer, pois tinha fome da longa caminhada que fazia e da qual ainda tinha que percorrer até chegar ao seu destino. Mas ao jovem a fama e os privilégios ganhos na corte do rei lhe haviam atiçado a soberbia e tratou o velho com desdém e vilania e já se dispunha a partir, o jovem quando o idoso lhe lançou um desafio; Um desafio de arco e flecha.

O jovem arrogante aceitou sem demora e jocosamente o desafio do velho. A aposta era simples em um primeiro momento, pois o velho pedia apenas algo da comida que havia reunido o jovem, enquanto o jovem que confiante de sua habilidade e preso em sua arrogância pretendia humilhar o velho pedinte, e demandou que se ele ganhasse o velho passasse o resto da vida a servi-lo. A este pedido o velho retrucou que demandava o mesmo premio em troca de sua vitória. Os estrondosos risos dos acompanhantes encheram o campo silencioso, e se diz que o riso o jovem arrogante lhe encheu de lagrimas os olhos enquanto engasgado pelas gargalhadas aceitava confiante.

O desafio consistia em um único tiro a grande distancia, uma distancia quase tão longa quanto o máximo que o caro arco do jovem arqueiro alcançava no outro extremo desta distancia colocaram os amigos do arrogante jovem uma vara com uma moeda de prata em um extremo, aquele seria o alvo a ser atingido.

O jovem foi o primeiro a disparar, e sua flecha voou fiel em seu curso cravando-se com uma leve sacudida na vara menos de um palmo abaixo de onde a moeda tinia com o impacto da flecha na madeira. Um tiro quase perfeito considerando a distancia que a vareta emplumada da flecha devia percorrer, e em meio às aclamações de seus companheiros o arqueiro acreditava ter a vitória assegurada e um novo servente.

Neste tempo aqueles homens pouco olharam ao velho, e quando novamente voltaram seus olhos a ele quando o arrogante jovem lhe ia oferecer o arco para fazer o tiro, qual não foi sua surpresa, pois o que antes havia parecido um mero bastão se havia convertido agora em um arco cujo cordame vibrava como a corda tensa de uma harpa. A postura uma vez curvada do velho agora se erguia como aquela de um exímio arqueiro dos contos antigos, e assim que o viu a dúvida invadiu o espírito do jovem tolo. Quem haveria de ser aquele homem, que de um velho mendicante havia se transmutado naquele que mais parecia ser um Mestre do Arco. E não demorou muito para que a flecha partisse a grande velocidade daquele arco bastão e voasse certeira até que a ponta atingisse plenamente o centro da moeda.

Ante aquele feito foi o silencio que caiu ante o grupo e o arrogante arqueiro se viu forçado a admitir sua derrota, e pelo resto da vida serviu ao velho, sem jamais tocar novamente em um arco ou uma flecha.
– concluiu Dimas virando-se para John. – Diga-me meu jovem, o que podemos aprender deste conto? - perguntou, com suas palavras a formar pequenas nuvens do frio que caia por aquelas horas sobre a colina do Paço.
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