Biat
O silêncio na capela de fundo ovalado próxima à capela mor é quase total. O que chega a ser estranho, diante da grande atividade que ali se desenrola. Partilhando da imensa tristeza que se abatera sobre o reino, acólitos e pajens pisam leve e murmuram dúvidas.
Do meio da nave a jovem senhora acompanha o trabalho sem perder de vista mesmo o menor detalhe. Muitas horas antes, ao receber a notícia da morte de sua soberana, mãe de seu amado Vitor, ficara em choque, sem querer acreditar no que lhe fora comunicado. Mas era real e mesmo imersa na dor percebera que ainda não era chegado o momento de viver sua tristeza. Muito havia a ser feito e pouco tempo para fazê-lo.
Despachara mensageiros e saíra decidida rumo à bela e ainda inacabada igreja do Paço da Ribeira. Escolhera o local, dera instruções precisas sobre o que e como queria. Agora acompanha a execução da etapa final do trabalho para que tudo fique perfeito dentro dos princípios de austeridade e simplicidade definidos para a arrumação do espaço.
Peças de veludo do azul mais profundo, arrumadas em grandes pregas sobre janelas e vitrais, trazem a noite para a capela isolando luzes, ruídos e um tanto do frio. Braçadeiras com as armas reais prendem os enormes arcos formados pelo veludo, evitando que percam a forma e a beleza.
Nas paredes de pedra, ao longo de toda a capela, quase duas dezenas de aquarelas retratam a história da soberana, com cenas de sua infância, juventude e de seu reinado, a última mostrando o infeliz acidente que resultara em sua morte.
Diante do altar, o grande bloco do mais fino e branco mármore, trabalhado com incrustações das armas reais e efigies da rainha. Rodeando o bloco, um conjunto de oito castiçais de nove braços, sustentados por estruturas de ferro trabalhadas como árvores que brotassem do chão da capela. As 72 velas imaculadamente brancas serão acesas a um só tempo tão logo o esquife pouse no bloco e seja aberto para que todos possam contemplar pela última vez o semblante nobre e belo de Ana Catarina I.
Ao longo da nave principal, desde a porta, espesso tapete de veludo vermelho cobre o caminho que será cruzado pela guarda real com o esquife. Ladeando o tapete vermelho, a espaços regulares, velas altas com diâmetro superior a 60 cm, que serão acesas por pajens de libré nas cores das armas reais à medida que o cortejo avance até a pedra diante do altar.
Nos anteparos de todos os bancos da capela repousavam velas em pequenos castiçais de ferro, prontas para serem acesas pelos que vissem velar sua rainha.
A equipe de limpeza, última a entrar na capela, conclui sua tarefa. A dama anda lentamente pelo espaço na última verificação. Aprova cada detalhe e pensa como ficará bela a capela quando todas as velas se acenderem.
A Câmara Ardente está pronta. A dama ordena que seja aberta a grande porta.
Em breve a rainha de Portugal será recebida na capela do Paço da Ribeira pela última vez para ser honrada e velada por seu povo.
Neste espaço será oficialmente velado o corpo da rainha de Portugal, permitindo que nobres e plebeus prestem a última homenagem a sua soberana. A Câmara ficará aberta por 5 dias após a chegada do corpo. Terminado este prazo o corpo será levado para a capela de Santa Maria Madalena, da família Monforte, onde será sepultado (http://forum2.osreinos.com/viewforum.php?f=7216).
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