Estava um ameno dia naquele inverno de 1462, quando as irmãs passeavam pela praça. Um velho, que fechava pela última vez a sua demasiado antiga loja há já algum tempo, admirava-a em reminescências, e as irmãs, levadas pela curiosidade, aproximaram-se dele para falar, e espreitar para dentro da loja escura.
- Por 100 cruzados pode ser vossa! - guinchou imediatamente o velho, quase endireitado pela perspectiva de fazer negócio ali a pronto. As visivelmente ricas roupas das raparigas não lhes deixavam grande margem para se disfarçarem como gente de poucas posses e abonavam demasiado a favor das suas bolsas.
Boo olhava para a irmã, claramente tentada
- Eu sempre quis uma loja para praticar a minha costura, podiamos aproveitar. - propôs, sabendo que Fran raramente lhe diria que não. Fran franziu o sobrolho, e voltou a olhar para dentro da loja, hesitando. Conseguia sentir o cheiro a velho mesmo através das portadas encerradas. Talvez não fosse mesmo assim uma má ideia, já que faria Boo feliz - ela própria poderia aproveitar o espaço para vender venenos, remédios e mézinhas. Os pedidos mais costumeiros ao lado dos mais ortodoxos.
- Cinquenta, e algumas carcaças da minha última matança. - retorquiu prontamente, habituada a negociar em jeito de roubo e sabendo que o homem aceitaria sem hesitar o que já parecia generosidade à partida. Não eram assim tantas as pessoas que reconheciam a ex-condessa que havia sido julgada em tribunal por um roubo em escala há uns meses. Viriam a selar acordo em poucos minutos, ficando horas a ouvir as histórias do velhinho naquela praça movimentada.
(...)
A rapidez com que adquiriram o espaço em nada se reflectiu no tempo que o demorariam a conseguir deixa-lo pronto. Era preciso deitar abaixo estantes e velhos armários roídos por bem mais que o tempo, e o lixo acumulado no chão e paredes com os anos, mas as irmãs estavam empenhadas. Ao fim de umas semanas, e juntando os trapinhos artísticos de Boo com as aventuras ervanáceas de Fran, as manas estavam prontas a partilhar o espaço e oferecer o que tinham a dar às pessoas, em troca de dinheiro.
- O que lhe vamos chamar? - indagou Borboleta, enquanto ambas se refastelavam nas cadeiras de baloiço, bamboleando-se com canecas de cerveja. Fran engoliu a custo a cerveja - sempre fora verdadeiramente horrível para inventar nomes. Ervas e brinquedos tinham o quê em comum?
Espantosamente, afinal a resposta tinha-a na ponta da língua - a erva favorita das irmãs e com que decoravam tantas vezes a casa e que agora repousava numa jarra à entrada de casa - o milefólio, ou brinquedo do diabo como o povo lhe chamava. O seu nome na língua mais original era -
-Achillea millefolium. - propôs, sorrindo maliciosamente.