Ltdamasceno
Recomendo-os ler esse trecho ao som dessa música:
https://www.youtube.com/watch?v=fe8qRj12OhY
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Os acontecimentos a seguir ocorrem a partir do dia 30 de Junho de 1462...
O fatídico dia havia chegado, depois de deixarem Lisboa, Abeth havia piorado da Febre de Alexandria e desmaiou durante o retorno a Santarém. Damasceno procurou por médicos averroístas na cidade, mas recebeu a notícia que não havia nenhum que professasse a religião do Altíssimo. Decidiu que iria permanecer com irmão enquanto este estava acamado e acabaram por ficar em Santarém pela a noite. Damasceno não dormiu pensando no pior, orou ao Único em silêncio, buscando por orientação e sabedoria para lidar com o que fosse acontecer daquele dia em diante, mas a sensação que teve era de que o Único não lhe ouviria naquela noite. Algo sombrio havia acompanhado a caravana dos mouros e estava com eles ali, naquele quarto.
No dia seguinte Abeth já se sentia melhor, mas não falou quase nada o dia todo. Insistiu, porém, em viajar sem delongas de volta ao Condado de Coimbra. Ele pertencia ao Conselho da época e não desejava ficar mais tempo que o necessário fora do seu gabinete. Damasceno relutou, mas acabou por honrar o desejo do irmão em viajar assim que o sol raiasse.
Durante a viagem à Alcobaça, Abeth manteve o silêncio e Damasceno guiava a carroça entristecido e preocupado. Tempos depois, a sensação que Damasceno teve era de que o seu irmão sabia que iria morrer, mas não queria que a família chorasse por ele antes da hora. Por alguma razão Abeth quis arriscar a viagem para Alcobaça, talvez porque amasse o seu Condado e desejasse ser enterrado lá, ou talvez simplesmente não quisesse atrapalhar a viagem de seu irmão. Damasceno nunca soube qual dos dois motivos seriam a causa, mas sabia que ambas seriam decisões que seu irmão tomaria.
Quando chegaram em Alcobaça, o Patriarca foi até o mercado procurar por médicos averroístas, porém uma vez mais em vão. Quando finalmente decidiu cessar as suas buscas, um garoto correu ao seu encontrando dizendo:
- Meu senhor, meu senhor, sua cunhada mandou me dizer que vosso irmão está morrendo. Venha comigo, rápido. Damasceno sentiu a escuridão preencher o seu estômago e lhe tomar o ar dos pulmões, percebeu como as trevas gelavam o seu corpo e por alguns instantes sentiu a mesma agonia que seu irmão estava sentindo naquele momento. Quando o garoto começou a correr, Damasceno o seguiu sem dizer nada até chegarem na estalagem. Lá ele encontrou sua esposa Amy na entrada com um olhar triste, ele olhou para ela e esperou que ela lhe dissesse que era mentira, mas a mesma apenas tocou a face do marido, como uma tentativa de consolá-lo. O desespero do mouro parecia incontrolável quando ele entrou na estalagem e correu para o quarto onde estava o irmão, já moribundo.
Ao entrar, encontrou sua cunhada Talita tentando acalmar Abeth, ela estava sentada no canto esquerdo da cama, com a mão na testa dele. O Patriarca percebeu que seu irmão estava completamente suado e que já agonizava por conta da febre. Era tarde demais, o pior havia começado. Vendo o irmão daquela forma, a sensação que o mouro teve era de que seu coração não batia mais e que ao invés de sangue, apenas as trevas, frias e vazias circulavam pelo o seu corpo. - Pai...me perdoe...pois eu falhei. Balbuciou Damasceno, contendo as lágrimas enquanto se ajoelhava ao lado da cama do irmão e este buscava por segurar as suas mãos.
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"E eu testemunharei que não há ninguém digno de adoração, exceto o Único."