Letícia adentrou o salão de baile, usando um lindo vestido vermelho e dourado, bem mais provocante e revelador do que o que usara na catedral, onde adotara um perfil mais discreto. Seus cabelos loiros e encaracolados caiam em cachos pelos ombros alvos. Estrategicamente a faixa da alça do vestido cobria a marca da cicatriz que o malfadado Estevão Lavre deixara.
Assim, infiltrada entre os convidados ela analisavas as fisionomias. Tornara-se especialista nisso graças as suas vivências. Poderia saber a origem e os hábitos de quem cruzasse seu caminho com uma análise rápida de roupas e modo de agir.
Havia ali os convidados que pertenciam a nobreza e estavam nos lugares privilegiados da catedral, e havia também aqueles que mal conseguiam esconder sua pobreza ou o seu gosto pouco refinado, próprio de novos ricos, que se davam mais valor do que realmente tinham para a sociedade em que viviam.
Os mais pobres admiravam a festa com o estômago, sonhando com acepipes que jamais provariam em suas casas e bebida que jamais poderiam pagar e uma taverna. E quem sabe não encontrariam uma princesa ou um príncipe dos sonhos?
Diante desses pensamentos e análises, Letícia se ria. Como podia ser o gênero humano tão inquietador, tão misterioso e ao mesmo tempo tão previsível.
Ela notou que a rainha ainda não chegara. Por um instante seus olhos cruzaram com a figura do encapuzado. Por um instante Letícia sentiu o sangue gelar. Não sabia o motivo, não conhecia o homem, mas havia algo em seu olhar que ela reconhecera, um sentimento que ela captara e que a assustara.
Tentando não pensar mais no assunto, ela agarrou uma taça de vinho que passava diante dela, servida em uma bandeja que um criado oferecia.
O jardim iluminado atraia mais gente, lá para o povo que não conseguira entrar no castelo, e não recebera convite, os saltimbancos também fariam um show. Ali os músicos também alegrariam a noite.