Yochanan
Parte 1 - O Jardim das Pedras
A pequena missão que se impôs para resgatar o sobrinho desaparecido havia minado em grande medida as forças do, ainda em recuperação, prior. Sua idade já não lhe permitia que feitos como aqueles que lhe foram exigidos o deixassem incólume como quando era jovem.
Assim, apesar de ter que estender sua morte por mais alguns meses, seu espirito estava tranquilo pois sua família estava bem e a Ordem havia sobrevivido.
Enviado por Alvorado à uma antiga, pequena e quase esquecida casa de cura dos Altai, o Viana viajou para o norte, além do Paço dos Arcanjos e do rio Lima adentrando as serras do norte português três dias após o solstício de verão. E quatro dias mais se passaram antes de que a pequena e lenta comitiva cruzasse os limites do Jardim das Pedras, nome que recebia aquela casa de cura.
A seu pedido, desde antes mesmo de partir em busca de Raphael, Alvorado havia estado avisando a Maese Teodoro, de quem havia sido discípulo muitos anos antes, do estado do Prior. Não era portanto nenhuma surpresa encontrar que era o reverendo ancião quem os recebia no jardim das pedras. O velho mestre já não usava o negro dos Azure, mas o hábito ocre e púrpura que os Altai costumavam usar antes da queda da Grande Ordem das Nove Sociedades. Apoiado em seu bastão, Teodoro era a viva imagem do sábio ancião, e nem o próprio Yochanan conseguia recordar como era aquele mestre quando jovem, apesar de que tinha a certeza que Teodoro não tivesse mais que uma trintena de anos a mais que ele.
Abriram-lhe a porta do coche, e o ajudaram a descer os pequenos degraus. Sua fisionomia ja delatava o esforço ao que havia se submetido. Mas o Viana ainda teimava em caminhar sem ajuda, assim, com passos lentos, percorreu a distância que os separavam e diante de Teodoro, lhe fez uma vênia respeitosa, pois aquela era a última verdadeira casa dos Altai.
-Que a Luz dos Nove ilumine o vosso caminho Maese. - disse o prior fazendo a saudação tradicional da Grande Ordem, levando a mão esquerda ao peito ao fazer a vênia.
-Que vosso caminho seja iluminado. - replicou Teodoro com a fórmula tradicional. - Bem vindo ao Jardim das Pedras, Prior. E tratemos que aqui o senhor descanse como deve. - ralhou-lhe com um leve toque de brincadeira.
-Tratarei meu amigo, tratarei. - respondeu o prior com um leve sorriso, meio apagado pelo cansaço, no rosto.
Quando as solidas portas se fecharam atrás deles, também fechou-se o mundo exterior ao outro lado delas. Ali, no jardim das pedras, o tempo se sentia diferente, e o mundo já não era o mesmo.
Continuará...
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