Quote:Quando Aristóteles tinha quinze anos, perdeu o seu pai e mãe e foi confiado à tutela de um parente próximo, Proxéne, que vivia numa região remota entre Estagira e Atenas. O jovem órfão foi educado no trabalho árduo do campo. Isto dificilmente o satisfazia, convencido que o seu espírito era mais capaz que as suas mãos. Encontrava-se frequentemente com camponeses humildes, com os quais Proxéne trabalhava. Ele admirava certamente o seu gosto pela vida simples, longe dos sumptuosos esplendores e do luxo que, pressentia ele, conduziam claramente ao vício. No entanto, Aristóteles surpreendeu-se com os seus costumes.
Um dia, viu um deles entregar-se à oração. Aristóteles recordou-se do seu último diálogo com Epimanos e ]quis apanhar o camponês em falta.
Aristóteles: A quem dirige as suas orações, bom homem?
Camponês: Aos deuses, meu jovem amigo.
Aristóteles: Aos deuses? Mas quem são eles?
Camponês: Eles são Afrodite, Apolo, Ares, Ártemis, Atena, Deméter, Dionísio, Hades, Hera, Hermes, Hefesto, Poseidon e o mais importante de todos, Zeus. Cada um deles senta-se no Olimpo.
Aristóteles: Onde é o Olimpo?
Camponês: É uma cidade maravilhosa, empoleirada no alto de um monte que nunca ninguém conquistou. Vês o Monte Atos? O Olimpo é cem ou mil vezes mais alto, ou algo assim.
Aristóteles: Alguma vez tentou subir essa montanha? Não está curioso de ver com os seus próprios olhos essas divindades a quem reza diariamente?
Camponês: Oh não, jovem. Eu sou apenas um humilde camponês. O meu lugar é aqui, não no Olimpo.
Aristóteles: Mas então, como pode acreditar na realidade desses deuses, se não tendes constatado a sua existência por si mesmo?
Camponês: Porque me ensinaram que eles existiam, e que devia rezar-lhes por melhores colheitas e para que as minhas vacas fiquem gordas.
Aristóteles: Isso é estranho, não rezais pelo amor do Divino, mas pelas necessidades materiais. Eu penso que é irracional buscar o material no espiritual. Mas sinceramente, não é a única coisa que acho irracional no que vós me dizeis.
Camponês: O que me reprovas ainda?
Aristóteles: Bem, há algo que não compreendo: porquê rezar a vários deuses?
Camponês: Como lhe disse, é o que me foi ensinado, que existiam vários e é assim desde o início dos tempos.
Aristóteles: Aqui está uma coisa complicada desnecessariamente. Em vez de várias divindades, não seria mais prático apenas rezar a uma?
Camponês: Começa a incomodar-me, jovem viajante. Eu faço-te perguntas? Eu pergunto-te se usas calções ou calças? Agora, deixe-me às minhas meditações.
Aristóteles: Não, não, eu não farei nada disso. Primeiro deve admitir, bom homem, que rezar a um único deus seria mais lógico. O que espera de um Deus, senão que seja omnipotente e omnisciente, que seja um? Adorar a vários deuses, é como fragmentar em várias partes o poder que o Único podia reunir em si. Eu acredito que em tudo, a unidade é preferível à divisão.
Camponês: Talvez.
Aristóteles: Não, é certo. O divino é uno e o divino é a perfeição, portanto a perfeição é a unidade. A unidade é a forma ideal das coisas.
Camponês: Certo, enfim para mim, jovem, eu sou demasiado estúpido para ouvir o teu jargão. Estou longe de ser letrado. Se eu te der um conselho, deixar-me-ás em paz?
Aristóteles: Bem, sim, concordo com isso.
Camponês: Toma a estrada para Atenas, se Proxéne o autorizar, e encontrarás ali um professor que te saberá escutar. O seu nome é Platão.
Aristóteles: Obrigado, bom homem.
E Proxène enviou Aristóteles a Atenas, às dezoito Primaveras de idade. O pobre camponês estava deveras contente de o ver partir.